Em uma das releituras do mais recente livro de Claudio Willer, senti uma força obscura e misteriosa que me obrigou a escrever o que senti durante vários dias. Era a mesma energia que me faz escrever alguma poesia.
Existe no livro revelações que passeiam pelos planos simbólico e real. O próprio título já antecipa essa característica marcante: é história e é verdade alternativamente.
O primeiro poema do livro, quando foi lido na Casa das Rosas, me deixou profundamente impressionado. Parecia ouvir aquelas pedras batendo na vidraça para atrair ou receber os versos, só que então eles já estavam ali, diante de mim e registrados no livro que eu tinha em minhas mãos.
Reli várias vezes até me certificar que neste poema estavam, em síntese perfeita, ideias que eu mesmo agitava em minha mente: vida/morte, amor louco, o maravilhoso, o sublime, e para terminar: “a impressão de que viver foi inútil”.
Quase não acreditei no que estava a ouvir!
Vou citando a seguir alguns versos, às vezes pequenos fragmentos, que deixam clara uma característica que eu já pressentia estar no interior dos poemas: a aproximação do texto ao ser humano e a cada poeta, individualmente.
“você: véu de gaze azulada roçando, suave apelo”
Aqui a imagem é bem clara e leva a uma constatação da influência da cor azul, céu límpido, Picasso, Miró, evocações despertadas pelo verso. Percebi nesta altura um dos motivos profundos, inconsciente por certo, da influência grande da cor azul, recorrente em quase tudo que escrevo. Quando não está a palavra, está a lembrança dela, sua paz, o retrato do infinito.
Em “Trópico de Capricórnio”, outra coincidência de palavras, logo no primeiro verso: “fragmentos celestes”. O livro que publiquei em 2010 tem a palavra “fragmentos” em seu título, que se volta para os sertões, com sua poeira, seus fragmentos de terra seca.
Na série intitulada “Cinemas”, os primeiros versos são certeiros: “ensinar a enxergar”, “sempre amei as imagens”, “este é o mergulho na densidade do mundo”, “os monólogos” (quem assistiu “Persona” sabe do que se está falando ou rememorando). Mesmo um filme que não existe está presente no livro. Recordo aqui a afirmação de que depois do sopro do primeiro verso, o demônio se encarrega do resto, ressalvando que aqui o demo é apenas uma figura imaginada, que existe mas não é, como ponderou Guimarães Rosa.
Assim como “Chuva oblíqua” de Fernando Pessoa equivale a uma aula de pensamento analógico, Claudio Willer com este livro dá uma aula sobre poesia surrealista.